terça-feira, 26 de julho de 2016

lar, doce lar

Lar, doce lar

ACTA DA REUNIÃO NÚMERO MIL NOVECENTOS E SETENTA E TRÊS
DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO COVA DO GATO
Aos vinte dias do mês de Julho de dois mil e dezasseis, pelas vinte horas e trinta minutos, na marquise do 3º esq., reuniu o Conselho de Administração do Condomínio Cova do Gato, estando presentes: --------------------
A Elvira Mamona que presidiu, os condóminos Besugo de Amorim, Lapadas dos Santos, Arminda Leituga, Nicole Mel e Joyce Doce----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Não esteve presente, mas justificou a falta, José Marreco, morador nas águas furtadas1, por se encontrar de férias nos próximos quinze anos. ---------------------------------------------------------------------------------------------------
1Espaço entretanto reconvertido em estufa com luz, humidade e temperatura controladas. Movido por um imensurável espirito empreendedor, o José Marreco, ou só Marreco para os amigos, resolvera investir no negócio das plantas de estufa fumáveis.
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----- A ordem de trabalhos agendada era a seguinte: ------------------------------------------------------------------------------------- Ponto - 1 Informações ------------------------------------------------------------------------------------------------------
---------- Ponto - 2 Abastecimento de luz ------------------------------------------------------------------------------------------
----------.Ponto - 3 Obras de requalificação no condomínio------------------------------------------------------------------
----------.Ponto - 4 Pagamento do IMI ----------------------------------------------------------------------------------------------
---------- Ponto - 5 Regulamento de criação, utilização e abate de animais-----------------------------------------------
------- A Presidente do Conselho, agradecendo a presença de todos os conselheiros, excepção feita para a condómina Arminda Leituga2, deu início à reunião. --------------------------------------------------------------------------
2 Elvira Mamona brindou Arminda Leituga com um olhar aterrador. Uma desavença antiga originada numas partilhas, nomeadamente a nível do marido da primeira, patrocina o clima de azedume.
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------ A Presidente do Conselho informou os condóminos da recepção de uma factura de electricidade para pagamento. Acrescentou que o inédito facto se deveu a uma avaria na puxada de abastecimento do condomínio. Mais informou que a dita anomalia resultou de actos de vandalismo, levados a cabo por um grupo de indivíduos fardados de azul.---------------------------------------------------------------------------------------------
A Presidente do Conselho informou também que recebera uma carta do condómino José Marreco, na qual solicita a colaboração dos restantes condóminos para regar os vasos das plantas medicinais sitos na sua estufa. Na missiva recebida, Marreco alerta para o facto de conhecer com rigor o número de plantas, desencorajando assim a sua transplantação ou consumo não autorizado.------------------------------------------------
A condómina Nicole fez uso da palavra para implicar Joyce na origem das três rugas efectuadas à sua casa, em resultado de denúncias sobre negócio ilícito de massagens. Prontamente, Joyce manifestou ao Conselho a sua indignação e repúdio pela conduta difamatória da condómina Nicole, que diz ser motivada pelo ciúme e ganância. Acrescentou ainda que, as cerca de vinte visitas masculinas diárias, resulta, apenas e só, da sua superior competência a ministrar massagens relaxantes.----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
---------- Ponto - 2 Abastecimento de luz ------------------------------------------------------------------------------------------
-------A presidente propôs ao Conselho que a reposição do funcionamento da instalação eléctrica fica-se na incumbência do condómino Lapadas dos Santos. A presidente justificou esta escolha tendo por base o vasto currículo do condómino Lapadas, no domínio do desmantelamento de postos de transformação de alta tensão, operação realizada muitas das vezes em condições adversas, nomeadamente em carga e durante a noite. Submetida a votação, a proposta foi aprovada com os votos a favor do Besugo, Lapadas, Elvira, Arminda e Nicole. Nesta votação, absteve-se a condómina Joyce Doce.---------------------------------------------------
Foi ainda aprovada por unanimidade a proposta do condómino Besugo de Amorim, que sugeriu que o novo ramal, proveniente do parque de estacionamento do hipermercado vizinho, se fizesse pelas traseiras de modo a escapar à acção dos meliantes ---------------------------------------------------------------------------------------------
---------- Ponto - 3 Obras de requalificação no condomínio------------------------------------------------------------------
-------A Presidente do Condomínio apresentou de forma detalhada os orçamentos, relativos à pintura da fachada do imóvel. Apresentados os documentos, com a sugestão de algumas alterações de pormenor, foi aprovada por unanimidade a adjudicação da obra ao consórcio liderado pelo mestre Frieiras3.-------------------
3 Afamado construtor civil, que além de deter o recorde de derrapagens financeiras em obras públicas, consegue uns preços muito jeitosos ao nível dos materiais de construção.
Fazendo uso da palavra, Arminda Leituga pediu ao secretário que ficasse lavrado em acta o seguinte: “não pago e não tenho medo de ninguém!”. -------------------------------------------------------------------------------------------------
Sanados os ânimos e limpo o sangue do chão, a Presidente passou ao ponto 4 da ordem de trabalhos.----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
----------.Ponto - 4 Pagamento do IMI ---------------------------------------------------------------------------------------------
-------A Presidente apresentou ao Conselho o relatório elaborado pelo condómino Besugo de Amorim, no sentido do condomínio se esquivar ao pagamento do Imposto Municipal sobre Imóveis. Das propostas apresentadas passaram à discussão as seguintes: (1) simular a emigração de todos os condóminos, de modo que o prédio passe a ser classificado como devoluto; (2) desenvolver uma metodologia para afugentar o carteiro, evitando assim que ele entregue as cartas de cobrança.------------------------------------------------------------
O condómino Lapadas dos Santos usou da palavra para, num primeiro momento, classificar o Besugo apenas de parvo. Passou de seguida a justificar que tal qualificação se deve à proposta (1), uma vez que alguns, incluindo o próprio Besugo, estão sob termo de identidade e residência.-------------------------------------
A condómina Joyce acrescentou ainda que, além da citada medida de coação, ela era ainda emigrante ilegal. Neste contexto, a Presidente retirou de discussão a referida proposta.------------------------------------------------- Submetida a votação a proposta (2) foi também ela recusada. Apenas teve o voto favorável de Besugo de Amorim. Os restantes condóminos justificaram o seu voto de desaprovação, com base no facto do carteiro além de ser cliente das massagens da Nicole, todos os meses entregava os vales do rendimento mínimo de inserção e o vale da pensão de reforma do finado Joaquim Bolas4.---------------------------------------------------------
4 Ninguém sabia quem era o individuo, mas a maquia dava bastante jeito.
A condómina Arminda Leituga sugeriu: “não pagamos e pronto! Afinal de contas, duvido que o fiscal das finanças tenha coragem para se aproximar do condomínio.”. O Conselho acabou por reagir positivamente a tal afirmação, pelo que deliberou não pagar e pronto!--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
---------- Ponto - 5 Regulamento para os animais residentes no condomínio -------------------------------------------
-------A Presidente do Conselho expôs as alterações introduzidas no Regulamento de criação, utilização e abate de animais no condomínio. Evidenciou as três mais relevantes, nomeadamente, a proibição de animais no condomínio que não sejam potenciais candidatos ao churrasco; o uso indevido de espaços no condomínio para a instalação de capoeiros, designadamente em vãos de escada; a imposição do abate de animais com armas de fogo ficar limitada a espaços abertos, ficando assim proibido o seu exercício em cozinhas e marquises.---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
O condómino Besugo relembrou o Conselho do facto de ser proprietário de um felino, vulgo gato, que reside no condomínio há dois anos. Pese embora o facto do dito cujo não ser um candidato de primeira linha para o churrasco, Besugo de Amorim salientou a importância do Tobias na sua actividade de benevolência5.----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
5 Na calada da noite, Besugo dos Santos recolhia roupa para um desempregado, nomeadamente, ele! Como o grosso dos estendais alheios estão a alguma altura do chão, era fundamental o papel do felino no processo de subtrair roupa. Efectivamente, atirado para o vazio da atmosfera o gato tem que se agarrar a alguma coisa!
Arminda leituga, apesar de considerar robusta a justificação apresentada pelo condómino Besugo, propôs ao Conselho a expulsão imediata do Tobias. Para memória futura, ficam lavradas em acta as exactas palavras de Arminda Leituga: “A cavalgadura do gato não passa de um vulgar gatuno, ainda na semana passada roubou um chicharro lá de casa! Ou o metem na rua, ou eu arrebento-lhe a boca!”.-----------------------------------------------------------
Incentivada pelo escalar de violência entre Arminda Leituga e Besugo de amorim, a Presidente do Conselho protelou a discussão deste ponto para reunião a agendar. -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
----- Pelas vinte e três horas deu-se por encerrada a reunião, da qual foi lavrada esta acta que, depois de aprovada, vai ser assinada pela Presidente e por mim, Lapadas dos santos, que a secretariei. ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

quarta-feira, 20 de julho de 2016

República dos cartoons

República dos cartoons

Movido por um espirito patriótico quase ilimitado, resolvi promover debates para discutir o estado da nação. Nesse sentido, solicitei a presença das mais altas individualidades da esfera pensadora. Resultado da elevada adesão à iniciativa, fui obrigado a colocar mais duas cadeiras na mesa de seis lugares.
Após longa e profunda reflexão[1], foi delineado, não só um modelo de gestão, como também um executivo para comandar os desígnios da nação. Entre os nomes avançados para constituir o executivo estavam, entre outros, nomes sonantes como o Tio Patinhas, o Homer Simpsom e o Averell Dalton. Infelizmente, o Noddy, escapou ao consenso geral por prevaricar amiúde[2]. A falta de unanimidade entre os conselheiros, acabaria mesmo por ditar o seu afastamento.
O Tio Patinhas haveria de ficar com a pasta das finanças. O seu perfil avarento e angariador de fundos, mais que adequado, assim o recomendava. Basta para isso ter em linha de conta que em seu entendimento, todas as despesas que escapam ao regime alimentar designado de a pão-e-água, são supérfluas.
Entre as propostas mais emblemáticas, o Tio Patinhas sugeriu a criação de um imposto verde, para tributar o consumo de oxigénio. Aos consumos superiores a 60 inspirações por minuto, seria aplicada uma tarifa igual a 1% do vencimento, por inspiração. Notar que, além de ser amiga do ambiente, tal contribuição assenta numa estratégia de justiça social, em que quem mais ganha, mais paga. Agora vejam bem o alcance económico desta medida. Para isso, basta considerar o caso de um fim-de-semana desportivo, isto já para não mencionar os períodos dourados que seriam os das competições desportivas.
Outra proposta, não menos genial, passaria por acabar com a remuneração mensal dos funcionários públicos. Em vez desse luxo, tais trabalhadores passariam a auferir de uma mesada. Tal medida, além de permitir enormes poupanças, evitaria eventuais desvaneios[3] dos ditos funcionários.
Os assuntos do emprego e da solidariedade social seriam confiados ao Calimero. Aqui convirá referir que algumas das características desta ave, como sejam, a simplicidade, a honestidade e o bom coração, colocaram em risco a sua nomeação. Contudo, foi valorizado o seu estilo infeliz e lamuriento, que decerto daria um certo jeito para anunciar subidas de impostos.
No caso dos desempregados a solução apresentada passava por criar um programa designado de Comboio Rosa. Segundo este programa, qualquer individuo desempregado, após dois dias em tal condição, era encaminhado para uma estação de caminho-de-ferro, secreta, onde embarcava num belo comboio cor-de-rosa. Após transpor a fronteira, os dito cujos eram largados à socapa, passando automaticamente a possuir novo estatuto, o de emigrante!
À medida anterior, juntar-se-ia a cessação de qualquer auxílio social, incluindo reformas de aposentação. As reformas seriam evitadas através da adopção da directiva “tombar em serviço”. A reforma, passaria a ser desonrosa para qualquer cidadão que apresentasse uma incapacidade física e ou mental abaixo dos 99%.
Ao Pinóquio, seria entregue o ministério da economia. A escolha, não poderia ser mais feliz. Logo à partida, e sem qualquer medida de monta, a produção de madeira dispararia proporcionalmente com o número de intrujices. De facto, esta ficaria somente sujeita ao número de intervenções públicas[4]. Além da exportação de madeira, tal personagem propunha para a alavancagem da economia a produção massiva de delícias do mar. Aliás, haveria mesmo investido o seu intelecto na lavragem de um tratado intitulado, “As delícias do mar. A criação em viveiro”.
Para estimular o consumo interno, os bens primários passariam a ser tributados apenas a 50%. Excepção feita para o vinho e seus derivados. Além de isentos, estes produtos passariam a auferir de uma subvenção de apoio ao consumo. Os ganhos desta medida, além de económicos, seriam também sociais. Senão vejam! O consumo indiscriminado de vinho potenciaria, não só, um alargado estado de felicidade e euforia, como também um forte aumento da receita fiscal, por via das contraordenações de trânsito.
Na educação e ciência, Homer Simpson, decerto que fará história. A questão do financiamento do sistema passa, de forma definitiva, a ser solucionada. Mais, a expressão cortes no dito, deixaria mesmo de fazer qualquer sentido. Para tal, o sistema educativo passaria a depender, apenas e exclusivamente, dele próprio.
Por outro lado, a carreira docente passaria a ser em regime de voluntariado[5]. Ao aforro económico desta medida, juntar-se-ia uma outra vantagem, nomeadamente no que respeita à colocação dos docentes. As escolas passariam a funcionar como um quartel de bombeiros voluntários, que em caso de necessidade fariam tocar uma sirene. Ora, em tal situação, os professores ao toque da dita, iriam a correr para a escola para leccionar[6].
Resumindo, o ano lectivo passaria a ser qualquer coisa como a época dos incêndios, mas sem os meios aéreos. Os directores de escola seriam os comandantes operacionais no terreno e, o ministério o posto de comando estratégico. Não tinha por onde falhar!
Neste cenário, a credibilidade do ensino haveria de ser elevada aos píncaros. Qualquer candidato a professor voluntário, além de ser sujeito a uma bateria de provas escritas, em substituição de um curso superior, teria ainda de cumprir em corrida uma distância de 10000 metros, num máximo de 5 minutos.
Na ciência, a brilhante estratégia delineada, deixava adivinhar a conquista de uns quantos prémios Nobel. A ideia base seria a de promover a investigação assente no princípio “Desenvolver para comer”. Os centros de investigação deixariam de auferir de financiamento monetário, passando este a ser em senhas de refeição. Certamente, seriam evitados gastos desnecessários na compra de equipamentos inúteis[7]. Mais, ficando a atribuição de senhas dependente da produção científica, seria assim também mais eficaz o controlo da obesidade.
Para a justiça, seria indigitado o Averell Dalton. A preferência por tal personagem deveu-se, essencialmente, ao seu profundo conhecimento sobre o sistema judicial.
A sua proposta de reformulação da justiça era no mínimo genial. Em linhas gerais, assentava num modelo de proximidade e de decentralização dos serviços. Em alternativa ao modelo clássico dos tribunais, funcionando em edifícios, seria implementado um verdadeiro paradigma de vizinhança, o tribunal itinerante. Para isso, bastava equipar umas furgonetas com uma mesa e umas quantas cadeiras. Assim seriam evitadas despesas com os imóveis e permitiria ao cidadão poupar em despesas de deslocação. Com a introdução deste conceito, os utentes apenas teriam que gerir a sua agenda, em função do dia da passagem do tribunal lá pela terra.
Outra vantagem estaria na introdução de novas valências no tribunal itinerante, nomeadamente no domínio da transação de bens. Nos locais mais remotos, a passagem da furgonete poderia ser facilmente rentabilizada, por exemplo, através da venda de pão, fruta, mercearia, peixe, carne e até delícias do mar. Obviamente, tal serviço funcionaria em estreita colaboração com o ministério da economia, titulado pelo ministro Pinóquio.
Para o tribunal constitucional, a proposta de Dalton, não ia no sentido da sua extinção, mas sim de um funcionamento em regime de convocatória. Assim, este passaria a ser do tipo reunião de condomínio, em que o administrador era o ministro. Desta forma, assegurava que todas as propostas avançadas pelo executivo, honravam a Constituição da República.
Por outro lado, o conceito tradicional de cumprir penas em penitenciárias, seria também ele totalmente revolucionado. Os castigos passariam a ser cumpridos em habitação própria, evitando assim despesas com alimentação e alojamento. No sentido de prevenir fugas, a casa de cada recluso seria armadilhada com um dispositivo dotado da mais avançada tecnologia, nomeadamente, rede mosquiteira electrificada em todos os acessos.
Os assuntos da agricultura e do mar ficariam a cargo do Zé colmeia e do Pirata Sam, respectivamente. Seria, portanto, uma liderança bicéfala. Nestes domínios a politica a seguir apontaria no sentido de abater toda a frota pesqueira e proibir o cultivo de qualquer espécie de planta. O objectivo era garantir a preservação das espécies e dos solos.
O consumo de hortícolas passaria a depender única e exclusivamente de espécies de surgimento espontâneo. No que toca ao peixe, apenas seria permitido o consumo de enlatados de importação. Para evitar eventuais prevaricações, de pescadores e agricultores, seria criada uma força especial aerotransportada de fiscalização.
Em linhas gerais, o modelo de governação estava assim alinhavado. Todavia, escaramuças entre alguns dos intervenientes nesta reflexão, nomeadamente ao nível da aplicação repetida de garrafas em cabeça alheia, ditaram o embargo de tão ambicioso plano de governação. Do debate, resultariam ferimentos em três, repito, em quatro dos pensadores, tendo mesmo implicado o internamento de cinco deles.





[1] Esta só não se alongou mais, porque após duas horas, já tinha acabado o vinho.
[2] São frequentes as situações em que conduz na via pública sem habilitação legal para tal.
[3] Enquadram-se, por exemplo, atitudes como ser proprietário de mais de um par de sapatos, usar roupa diferente todas semanas e habitar casas luxosas, daquelas que têm duas ou mais assoalhadas.
[4] Notar que sendo o Pinóquio em madeira e, o seu nariz aumentar com as mentiras, bastava ir cortando.
[5] Neste caso, os voluntários teriam direito às broas no Natal e equipamento de protecção individual, nomeadamente, anti-agressão.
[6] Notar que tal atitude, muito provavelmente, levaria que excedessem as 60 inspirações por minuto, entrando portanto em transgressão.
[7] Um caso bastante comum são os computadores. Afinal de contas, existindo papel e canetas, que raio de sentido faz gastar o dinheiro dos impostos em tal equipamento?

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Deus não usa relógio

Deus não usa relógio

Lá pelos 10 anos, apercebi-me de um detalhe que viria a afectar toda a minha existência. Tinha algo em comum com o Bart Simpson! Sim, esse cujos passatempos preferidos são andar de skate e fazer porcaria. Além de partilhar dos passatempos, tal como ele, desde o primeiro instante de vida que sou canhoto.
A simples existência de semelhanças com tal personagem, só por si, já não augurava nada de bom. Mas, a coisa não ficou por aqui. Uma breve pesquisa sobre o assunto viria a mostrar que o mundo foi engendrado pelos e, para os destros. De facto, o infortúnio é tal que, anualmente 2500 canhotos rumam à terra da verdade1 devido à utilização de produtos concebidos para destros. Não menos preocupante é, igualmente, o número de lesões graves provocadas por tais objectos. Exemplo disso, são todas e quaisquer ferramentas e, em especial, as que envolvam esforço físico.

1 Normalmente designada de última morada.

Todavia, a consulta da palavra canhoto num dicionário viria a sugerir um itinerário rumo à tragédia, ora senão vejamos:
adj. e s.m., Esquerdo; que habitualmente se serve da mão esquerda em lugar da direita. Desastrado, inábil.
S.m., O talão que não se destaca num livro de recibos.
Fig. Pop. O Demônio.
Só coisas boas… Ao que parece, desde sempre, a mão direita tem sido associada às coisas benévolas e puras. Por sua vez, a mão esquerda, com tudo o que é profano, malévolo, medíocre e imundo. Por exemplo, o milenar aperto de mão é executado com a mão direita, isto para evitar a sujidade2 da esquerda.

2 Na antiguidade, embora pouco habitual, a higiene ficava a cargo da mão esquerda. Notem que na época, mesmo que não precisassem, tomavam banho quase todos os trimestres.

Em diversos idiomas a palavra esquerdo, do latim sinistre, é sempre ruim. Para os bifes um left tem significados como fraco, inútil. No Japão, louco. Em Itália, desonesto, duvidoso. Sempre a somar! Na escrita, mais uma vez os destros são favorecidos. Salvo raras excepções, como é o caso do hebraico e do árabe, as letras correm da esquerda para a direita. Ou seja, o canhoto é forçado a fazer contorcionismo com o punho e, ainda assim, raras vezes enxerga tudo o que escreve. Como resultado disso, temos as luxações no pulso e textos deste calibre.
Apesar de tudo, sou um sortudo. Nasci em 1973! Se tal tivesse ocorrido na Idade das trevas, provavelmente teria acabado chamuscado. Pois, nem mais! Na época, a malta da Santa Inquisição recreava-se a incinerar canhotos. Para tal, os inábeis canhotos eram legitimamente acusados de bruxaria, de serem emissários da morte e, imaginem, do próprio Mafarrico. Se repararem, em qualquer representação do Juízo Final3, o Paraíso é indicado aos fiéis pela mão direita de Deus. Evidentemente, a mão esquerda recomenda o Purgatório. Afinal, Jesus está sentado na cadeira de palha situada à direita de Deus.

3 Evento precedido da ressurreição dos mortos e da segunda vinda de Cristo. Quanto à vinda do Messias, tudo bem. Agora o retorno dos finados é que seria bem mais problemático. Reparem que na sua maioria seriam pensionistas, ou seja, mais uma quantidade de oportunistas para viver à custa do estado.

Não julguem, porém, que os esquerdinos foram somente paparicados pelos cristãos. Pelo que consta, também Alá associa a esquerda ao Mafarrico. No Alcorão4, como na Bíblia, os fiéis a Deus sentam-se à sua direita. Como seria de esperar, a ala esquerda, sem lugares sentados, fica reservada para os amaldiçoados. Mais, há mesmo quem chegue ao ponto de garantir que o Criador tem duas mãos direitas. Ou seja, muito provavelmente, Deus não usa relógio!

4 A mão esquerda também está interdita no que toca às sagradas escrituras.


Por tudo isto, sugiro que de hoje em diante, no dia 13 de Agosto façam um brinde aos inábeis. Mas lembrem-se, as canecas deverão ser com asa para canhotos!