Entrudo
Ao
ilimitado génio criador do Zé Marreco deve-se, entre outras obras emblemáticas,
a criação de uma espécie de colectividade designada CROFT (Cooperativa
Recreativa Organizadora de Festas e Tainadas). Os sócios da CROFT, na sua larga
maioria palermas encartados, além de festas e tainadas, participam também em
qualquer tipo de ajuntamento, nomeadamente, greves às segundas e sextas-feiras,
manifestações expontâneas, comícios políticos e, caso não sejam convidados, em casamentos
e baptizados.
O
Zé Marreco, embora pouco adepto de filhós e rabanadas, resolveu envolver este
ano a CROFT nos grandiosos festejos de Carnaval da Ribeira de Janeiro,
freguesia berço da CROFT. A ideia foi organizar um corso multicultural que inclui-se
Matrafonas, Samba, Caretos, Gigantones e uma quadrilha de Zorros. Para Reis do
carnaval foram nomeados, sob coação física, os famosíssimos artistas Sabino Rui
e Joana Pina. Personalidades cuja ascensão ao estrelato se ficou a dever ao
exímio desempenho do Sabino como boi e da Joana como vaca, no presépio vivo dos
bombeiros voluntários.
As
bailarinas de samba foram cedidas a título de patrocínio pela danceteria Luar
Doce. As Matrafonas e os Caretos ficaram a cargo dos sócios da CROFT. Para
Gigantone foi empossado o Celso, conhecido em toda a freguesia por reanimar
garrafões de vinho, através de respiração boca-a-gargalo.
Todos,
incluindo os Reis, foram vestidos com trajes da mais distinta qualidade, quase oferecidos
pela luxuosa superfície comercial BAZAR CHINÊS – XIU MIAU. No que toca aos
Zorros, por serem uma praga de surgimento espontâneo, o seu ajuntamento foi
deixado ao acaso.
Chegada
a hora, o Entrudómetro, situado entre a Taberna do Cristo e a casa do Mingacho,
estava completamente lotado de esfoliantes e turistas vindos de toda a parte,
incluindo dois americanos emigrados na Lua desde 1969. Resistindo a um calor
escaldante de 3 graus, a multidão de quase 50 pessoas, aguardava
impacientemente o início dos festejos. A segurança, estava a cargo de uma
patrulha da GNR coadjuvada pelo Chico Knorr, especialista em escaramuças e
churrascos.
Iniciado
o corso, tudo corria dentro do planeado. Incluía de tudo, até a sátira política
estava presente. Por exemplo, num dos carros alegóricos podia ler-se: “O
Presidente da Junta e a secretária andam enrolados” e noutro: “O Presidente só
usa o cartão de crédito da Junta no Luar Doce”, enfim, desabafos normais do
povinho!
Contudo,
no decorrer do cortejo, iniciaram-se as tradicionais rixas de ocasião que
inspiraram os Caretos, nomeadamente o seu líder Anacleto, a desatar à lambada a
um grupo de fuzileiros mascarados de escuteiros. Consequência de tamanha
imbecilidade, o corso ficou privado da participação dos caretos, entretanto internados.
Depois, uma desordem de base etílica levou o Tonho João a confundir a Emília
Peixeira com uma Matrafona. Vai daí, a Emília, sem estar de modas, aplicou tamanha
arrochada no Tonho João que este saiu virado ao Borracheira que conduzia um tractor
atulhado de Matrafonas. O tractor dá uma guinada e vai abalroar um pelotão de
Zorros. Entretanto, o Gigantone Celso, ao sair da Taberna do Cristo, já convenientemente
hidratado, tropeça na soleira da porta e, ao estilo de um míssil balístico,
invade o cortejo. Depois de vários ameaços, meteu a quinta e acabou por se
espatifar contra o piano de cauda da orquestra filarmónica.
Todavia,
a situação só haveria de descambar por completo, quando uns indivíduos do SEF, diga-se,
criminosamente, inibiu os amantes do Samba de presenciar o espectáculo
desenvolvido pelas desnudadas bailarinas e seus varões. A desculpa para
confiscar as bailarinas foi que não sei quê ilegais. A revolta foi total! Os
operacionais da GNR presentes no teatro de operações, desprovidos de meios para
interagir com a multidão enfurecida, deliberam, por unanimidade, ir beber uma
mini. Entretanto, de tudo era arremessado, desde andarilhos, garrafões de vinho
vazios e até a mulher do Patolas foi parar ao tejadilho da viatura do SEF.
Enfim,
a coisa correu mais ou menos mal! Além de Caretos, Matrafonas e Zorros
amassados, o presidente da Junta passou à condição de sem abrigo solteiro, o
Luar Doce fechou por falta de stock e
a GNR autuou o Anacleto por estupidez agravada e o Celso por excesso de
velocidade. Por tudo isto, o Zé Marreco embargou, por tempo indeterminado, a
participação da CROFT em todas as celebrações religiosas que envolvam andores
ou carros alegóricos.
Sem comentários:
Enviar um comentário